Junto com os números sinistros da pandemia de coronavírus, que deverá ter vitimado meio milhão de pessoas até o fim do primeiro semestre, o Brasil atravessa uma crise social muito profunda. As estatísticas mais recentes dão conta de que a quantidade de pessoas passando fome é cada vez maior, ao mesmo tempo que o desemprego e a inflação vão tornando as condições de vida ainda mais miseráveis.
De acordo com levantamento feito por pesquisadores do grupo “Alimento para Justiça”, da Universidade Livre de Berlim, em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e a Universidade de Brasília (UnB), o País estaria com mais gente passando fome do que no final do governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC), que marcou a mais profunda experiência neoliberal até então. Foi essa situação de explosão social, inclusive, que levaria à vitória eleitoral do PT em 2002 e à permissão da burguesia para que algum tipo de política social fosse aplicada.
O estudo, que foi financiado pelo governo alemão, foi realizado entre os meses de novembro e dezembro de 2020 e utilizou 2 mil pessoas como amostra. E os resultados são impressionantes: 15% da população se encontra em insegurança alimentar grave, e 12,7% em insegurança alimentar moderada, o que significaria que “corriam o risco de deixar de comer por falta de dinheiro”. Em relação à população brasileira como um todo, isso equivaleria a 58 milhões de pessoas, ou 27,7% dos brasileiros.
Outras 31,7% foram consideradas pelo estudo como em estado de insegurança leve, que seria quando há a “preocupação de que a comida acabe antes de se ter dinheiro para comprar mais” ou “faltam recursos para manter uma alimentação saudável e variada”. Com isso, o número de pessoas que teriam desenvolvido algum grau de “insegurança alimentar” seria de 125 milhões de brasileiros, o que corresponde a quase 60% da população!
A tal “insegurança alimentar” é uma dessas invenções da imprensa capitalista para ocultar o que de fato está acontecendo. Trata-se de uma prática comum: falar em “reforma da Previdência”, em vez de “roubo da aposentadoria”, “desestatizar”, em vez de privatizar, “países emergentes” em vez de “países atrasados e oprimidos pelo imperialismo”. Neste caso, é muito claro qual é o objetivo; esconder que o povo está, na verdade, morrendo de fome.
Segundo dados apresentados pela Folha de S.Paulo em 2020, nada menos que 58 milhões de pessoas recebem um salário de até R$ 500 reais! E desse contingente, 13 milhões estariam, inclusive, sem renda nenhuma durante a pandemia. Em São Paulo, Estado mais populoso do País, a cesta básica, que supostamente conteria tudo aquilo que alguém precisaria comprar para não morrer de fome, estaria custando R$631 no mês de dezembro!
A situação gravíssima em relação à fome, se de fato os dados oficiais não estiverem subestimados, o que seria muito provável, são um reflexo da política de terra arrasada que está sendo conduzida pelos golpistas. Pouco tem a ver com a pandemia: a crise sanitária é tão somente um agravante. A situação social do País já estava sendo fortemente afetada desde que a direita, impulsionada pela crise capitalista de 2008, decidiu sabotar o governo do PT para estabelecer um governo duramente neoliberal.
A situação do Brasil, inclusive, não está restrita somente ao seu território. Trata-se de um problema de toda a América Latina e, finalmente, de todo o mundo. Até mesmo nos Estados Unidos, no coração do imperialismo, a situação social é extremamente precária. Na Europa, em países como a Espanha e a França, as condições sociais estão tão degradantes que a extrema-direita, demagógica por natureza, tem crescido rapidamente.
Na América Latina e no Caribe, onde a situação é muito semelhante à do Brasil, o colapso social já está dando a enormes revoltas. A situação social na Bolívia era tão crítica após o golpe militar que a burguesia se viu obrigada a recuar e permitir que uma ala direita do Movimento ao Socialismo (MAS), partido nacionalista boliviano, voltasse ao governo. Na Argentina, diante de uma crise social de enormes proporções após o governo de Mauricio Macri, o imperialismo também acabou permitindo, temporariamente, que Alberto Fernández vencesse as eleições presidenciais para fazer alguma política social enquanto a direita prepara a próxima ofensiva.
Esses sinais de revolta se encontram presentes no Brasil também. O apagão no Estado do Amapá levou a população a entrar em conflito com a polícia, expressando a tendência à revolta. E os mais recentes saques, registrados em todas as regiões, mostram que a situação é desesperadora.
É papel da esquerda e de todas as organizações do povo trabalhador, portanto, aproveitar a tendência à revolta e mobilizar o povo contra o regime golpista, que está levando o País para o precipício. Contra a política de fome, de morte pelo coronavírus, de entrega do País ao capital estrangeiro e de destruição dos direitos trabalhistas, é hora de arregaçar as mangas e dedicar todas as energias para organizar um ato de primeiro de maio que sirva como meio para os trabalhadores colocarem sua revolta nas ruas.