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Mais desmonte do Estado

Câmara “antifascista” congela salário de servidores por 15 anos

Política de aliança com "direita anti-fascista" faz a esquerda parlamentar levar os trabalhadores à derrota

A Emenda Constitucional 109/2021 é o capítulo seguinte da Emenda 95/2016, ataca diretamente dos servidores públicos e amplia a hegemonia do capital financeiro sobre o orçamento público.

No que se refere ao funcionalismo público, o governo golpista de Bolsonaro e Guedes deu nesta semana (15/3) o primeiro passo da Reforma Administrativa da qual tanto desejam. Uma reforma que ataca frontalmente o funcionalismo público, disciplinando e domesticando o conjunto dos servidores para que aceitem o desmonte do Estado e a dominância de empresas privadas, mascaradas ou não como Organização Sociais, na gestão do Estado. A aprovação da PEC 186/2019 a toque de caixa no Senado Federal, aproveitando proposta apresentada em 2019 pelo senador Fernando Bezerra Coelho (MDB/SE), recheando-a de uma política de ajuste fiscal que complementa a Emenda Constitucional 95, de dezembro de 2016, é um instrumento de força que se manterá por muitos anos como ameaça constante sobre os servidores públicos municipais, estaduais e federais.

Um dos eixos da PEC 186, promulgada em 15/03 e transformada em Emenda Constitucional nº 109/2021, é o estabelecimento de regras que levarão ao congelamento de salários da maioria dos servidores públicos nos próximos 15 anos. Contudo, a prática nos diz que militares, policiais, ministério público e judiciário ficarão de fora. As categorias mais combativas serão penalizadas e enfraquecidas, quer com o congelamento dos ajustes salariais, quer com a proibição de realização de concursos públicos e a substituição dos servidores por mão-de-obra temporária e sem estabilidade.

A direita e a extrema-direita sempre tiveram ódio ante a possibilidade do funcionalismo público se aproximar das lutas populares e se comportar como segmento da classe trabalhadora. Na preparação para o golpe militar de 1964, o assessoramento que os EUA deram aos golpistas envolveu a criação do Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES), financiado por empresários paulistas, e o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD), criado no Rio de Janeiro e era financiado diretamente pela Agência Central de Inteligência (CIA). Ambos tinham entre outros objetivos a missão de criar a ideia de que o Brasil precisava formar um funcionalismo público “profissional” e “técnico”, que se mantivesse longe da ação dos sindicatos e dos movimentos populares.

É na preparação do golpe de 1964 que surge a ideia de se criar um funcionalismo como casta bem remunerada e protegida das demandas dos trabalhadores. Na ditadura militar (1964-1985) o nome dado a esse conjunto foi de “tecnoburocracia”. No governo FHC (1995-2003), as reformas administrativas tiveram por objetivo criar dois grupos de servidores. As carreiras de Estado e as carreiras comuns. A ideia era que os integrantes das carreiras de Estado deveriam ser protegidos com altos salários, estabilidade especial, e outras regalias. Estavam nesse grupo os diplomatas, os militares, os procuradores e alguns outros poucos. Os governos Lula e Dilma foram capturados por essas ideias “técnicas” e deixaram que isso fosse levado ao extremo. E hoje o país paga alto preço com parte do funcionalismo aderindo completamente aos interesses da burguesia e de partidos de direita e extrema-direta. Vimos isso na ação do Ministério Público Federal e da Polícia Federal nas operações criadas para destruir os governos Lula e Dilma e manter estreita aliança política com outros serviços da burguesia e do imperialismo (imprensa, judiciário, militares).

Esse movimento de deslocamento dos servidores públicos de sua base social produziu dos efeitos. Por um lado, a maioria do funcionalismo público, especialmente os cargos administrativos, os trabalhadores da educação e os trabalhadores da saúde, enganou-se com a ideia de que receberiam também o mesmo tratamento que estava sendo dado a uma aristocracia se servidores. Por outro lado, os trabalhadores em geral começaram a ver os servidores públicos como privilegiados e como autoridades estranhas aos trabalhadores.

O golpe de 2016 deu a esse processo novo sentido. A direita e a extrema-direta se uniram para reduzir o aparelho de Estado a um mínimo organizado e subordinado aos seus interesses, privatizando o resto. Por isso, o ataque aos servidores públicos passou a ser elemento central da política governamental. O governo Bolsonaro é o coroamento desse processo e os servidores pagarão preço alto.

PEC da Chantagem, servidores enganados

A PEC 186/2019 estava engavetada, mas com a desculpa de ter que aprovar uma nova Emenda Constitucional para viabilizar o auxílio emergencial (bastava um decreto prorrogando, em janeiro, o estado de calamidade pública) e transferências para os estados, a base governista aproveitou sua tramitação para dar a ela o jeitão de um toma-lá-dá-cá que a burguesia tanto queria (Vídeo da Auditoria Cidadã da Dívida).

A chantagem do governo foi vitoriosa. Para conceder um auxílio minguado e insuficiente ao conjunto dos trabalhadores que já estão passando fome e estão no desespero depois de acabar com o Auxílio Emergencial no final do ano passado, o governo exigiu que o funcionalismo público fosse penalizado e as políticas públicas das áreas de educação e saúde sofressem sérios cortes, além de incluir empresas privadas entre os destinatários de recursos públicos para a educação. Movimentos de pressão contra a retirada da Constituição da vinculação de gastos mínimos com educação e saúde acabaram sendo parcialmente vitoriosos. Os governista fizeram de conta que estavam derrotados e tiraram do Substitutivo que estava para ser votado os itens relacionados aso gastos mínimos com educação e saúde. No dia 4/3 a PEC foi aprovada no Senado e encaminhada para a Câmara com urgência, onde acabou sendo aprovada no dia 11/3. A oposição esperneou, mas a grande maioria já havia sido formada a partir da hegemonia do Centrão. Foi transformada na Emenda Constitucional nº 109/2021 no dia 15 de março.

PEC da Chantagem, bancos levam a melhor

Aproveitando o forte aumento no número de mortos por causa do covid-19, o governo e a direita ligada aos bancos e às financeiras, colocou a sociedade contra a parede em meio a uma chantagem que a oposição não conseguiu desmascarar. “A chantagem para aprovar apresenta uma proposta de R$ 44 bilhões para auxílio emergencial, o que representa apenas 12 dias de pagamentos dos serviços da dívida pública federal em 2020. Dívida que nunca foi auditada, apesar de constar a previsão da auditoria na própria Constituição.” (Auditoria Cidadã da Dívida, 15/3/21)

“A Proposta de Emenda à Constituição 186/19 foi apelidada de PEC da Chantagem, pois a inclusão do auxílio emergencial na PEC foi feita para pressionar a aprovação da proposta que coloca o ajuste fiscal na Constituição – que nada mais é que o corte de gastos em investimentos públicos como saúde, educação, tecnologia, previdência etc. – para que sobrem mais recursos ainda para pagar a dívida pública. Enquanto isso, o próprio Tribunal de Contas da União já afirmou que a dívida não tem servido para investimentos no país.” (Assufurgs, 12/3/21)

A partir de agora, estados e municípios estão sujeitos a uma disciplina fiscal muito mais rígida, que também se aplica, em parte à União. Isso significa que o pagamento da dívida pública continua prioridade nos orçamentos, mas agora com a Emenda Constitucional, os governos são obrigados a reservar mais recursos para pagar os bancos e os rentistas. O cálculo das despesas e da tomada de novas dívidas deve levar em conta o perfil da dívida no longo prazo. As leis orçamentárias dos entes federados deverá levar em conta isso. Quer dizer, nada de dinheiro para políticas públicas se o pedaço que é reservado aos bancos e rentistas não estiver garantido. Para que isso ocorra, os estados e municípios poderão (deverão) reservar uma parte das suas receitas em impostos para o pagamento das dívidas. Assim, haverá uma redução dos recursos disponíveis para as políticas sociais e os investimentos. Tira antes de tudo o dinheiro para banqueiros, depois, com o que sobrar, paga-se salários, educação, saúde etc.

A Emenda Constitucional 109 cria gatilhos para os cortes de despesas e reforça o garrote criado pela Emenda Constitucional 95/2016, que congelou os gastos por 20 anos. Ambas as Emendas têm vigência até 2036. Caso seja previsto que nos doze meses seguintes as despesas correntes poderão ultrapassar 95% da receita estimada, os servidores públicos ficarão sem qualquer reajuste salarial, não poderá haver criação de cargos, mudanças em carreiras e contratação de pessoal, nem realizados concursos públicos ou a aprovação de qualquer ação que implique em aumento de despesas. Se for apurado que a trajetória das despesas vai ultrapassar 85% da arrecadação, a Emenda Constitucional autoriza dos governos a realizarem os bloqueios antes mencionados.

A EC 109 vai reduzir o tamanho dos orçamentos públicos municipais, estaduais e federal. Depois de tirar os compromissos com as dívidas, o que sobrar vai para as políticas públicas, nos limites (tetos) impostos pelas duas Emendas. Isso significa que, na prática, os mínimos constitucionais para gastos com educação e saúde serão mais minguados e representarão orçamentos menores para a educação e saúde.

Além disso, a ciência e tecnologia, que está sendo fortemente atacada desde o Golpe de 2016, vai sofrer também. Em uma manobra de última hora, o Mesa da Câmara fez uma alteração na redação do art. 5º da Emenda Constitucional, deixando que superávits dos fundos destinados à ciência e à tecnologia sejam usados para o pagamento da dívida, o Senado havia aprovado uma vedação a isso. Com isso, o governo vai contingenciar os fundos de C&T e usará os “superávits” forjados para pagar banqueiros e rentistas.

Essa Emenda Constitucional inicia a reforma administrativa que os golpistas tanto desejavam desde o golpe de 2016. Outras medidas serão tentadas, escondidas no meio de Medidas Provisórias ou de Projetos de Lei, com o objetivo de regulamentar a Emenda Constitucional.

Em nota pública o Partido dos Trabalhadores afirmou que “o governo chantageou a população e o Congresso, cobrando como contrapartida de um auxílio emergencial de valor e cobertura menores, que exclui cerca de 30 milhões pessoas, um ajuste fiscal estrutural e de longo prazo, que reforçará o desmonte do Estado e dos serviços públicos.” (PT, 16/3/21) Mas, em nenhum momento, relacionou essa derrota com a política que as esquerdas e as oposições mantêm de apoiar a direita chamada “civilizada” como forma (se isso fosse possível) de combater o fascismo (extrema-direita bolsonarista). A tal “direita anti-fascista” com a qual as esquerdas parlamentares se uniram é, na verdade, quem avaliza o desmonte do Estado, a privatização e o corte radical nas políticas de saúde e educação. Ir a reboque da “direita anti-fascista” vai transformar a esquerda em cúmplice do golpe (do de 2016 e do que virá) e algoz dos trabalhadores. E mais ainda. Subordinar a luta dos trabalhadores nos demais espaços políticos ao jogo interno do parlamento é caminhar rapidamente ao fracasso da luta.

Os servidores públicos que acreditarem na história da carochinha de que uma aliança com a “direita liberal” ou “direita civilizada” é a única forma de vender a “direita fascista” já começarão em breve a sentir no contra-cheque os efeitos dessa enganação. Os servidores que não se encantaram com a ilusão de que fazem parte da classe dominante, porque recebem 20, 30 ou 40 vezes mais que os trabalhadores de salário mínimo, estarão sendo atacados por todos os lados, em reformas sucessivas que tendem a retirar sua estabilidade, suas garantias constitucionais e também deformar o sentido das políticas públicas. O congelamento dos salários e promoções por 15 anos, a proibição de novas contratações por concurso público e o impedimento de melhorias funcionais é o primeiro passo de um golpe na cabeça do funcionalismo. Se for vitoriosa a ideia da subordinação das esquerdas e da classe trabalhadora a alianças com a ilusória “direita antifascista” para derrotar Bolsonaro-Mourão-Guedes, os próximos passos na direção da destruição de categorias inteiras de servidores serão ainda mais violentos.

Acreditar em uma aliança com a direta para combater a extrema-direita não é um erro qualquer. Será um crime histórico contra a classe trabalhadora.

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