O jornalista Breno Altman, editor do sítio Ópera Mundi, publicou no dia 17 de setembro um vídeo em seu canal no YouTube com o título “Por que o povo não se rebela contra Bolsonaro?”, no qual retoma alguma de suas ideias, já debatidas nesse Diário. A tese fundamental de Altman é a de que o País vive uma etapa de defensiva política e que, portanto, o povo teria dificuldades de se mobilizar. Assim, a tarefa da esquerda, das direções da esquerda e dos movimentos populares, seria colocar em marcha uma política de “resistência” aos ataques do golpe, de “luta cotidiana” em torno de reivindicações pontuais. Altman afirma ainda que o povo brasileiro se mobiliza “quando ele vê chance de vencer”, ou seja, as derrotas sofridas no terreno político levam o povo a uma depressão que só pode ser revertida diante de uma vitória importante.
Mas será mesmo fato que o atual momento é de total defensiva política por parte do povo? Desde o golpe de Estado, em que as forças da direita impulsionadas pelo imperialismo foram colocadas em marcha para derrubar o governo do PT, há no País uma enorme luta política. Tal luta se desenvolveu e passou por várias etapas. No início, a ofensiva da direita colocou a esquerda numa defensiva inicial. As manifestações da esquerda se davam em grande medida como uma resposta às manifestações artificiais convocadas pela direita.
Por um período, a balança da polarização política no País pendeu para a direita. Essa luta evoluiu, passou pela queda de Dilma Rousseff, pelo estabelecimento de Temer no governo mesmo com toda a impopularidade, a prisão de Lula e as eleições fraudulentas de 2018 que marcam, com a posse de Bolsonaro, a etapa atual.
Essa atual etapa marca de maneira muito clara que a balança da polarização política pende para a esquerda. É possível dizer inclusive que a balança nunca esteve tão favorável para a esquerda como agora.
São muitos os elementos que mostram isso. Em primeiro lugar, a iniciativa das mobilizações de rua foram até agora todas da esquerda. Grandes atos convocados por conta dos ataques à educação e contra a reforma da Previdência. Em todos esses atos, a palavra de ordem predominante e unificadora era estritamente política, o “fora Bolsonaro”, além da liberdade para Lula. Diante disso, a direita procurou convocar atos que nem de longe lembraram os primeiro atos coxinhas e que perto das manifestações da esquerda foram muito pequenos.
Não só a esquerda tomou a iniciativa como ela ultrapassou e muito as mobilizações dos setores de direita. Isso levando em consideração que a direita conta com o apoio de grandes máquinas da burguesia para inflar o ato.
Outro elemento é a própria popularidade do governo Bolsonaro que a própria burguesia não consegue esconder. O governo é, segundo as pesquisas oficiais, o mais impopular da história.
As manifestações espontâneas nos mais diversos locais contra o governo também demonstram que a situação política é favorável à esquerda. Não importa se é no carnaval, em festivais de rock ou concertos musicais, tudo é motivo para se transformar em uma manifestação.
Outro fator importante é o desenvolvimento da crise “por cima”. Os vazamentos da Lava Jato colocaram em xeque a operação que é um dos sustentáculos do governo Bolsonaro. Vários nomes importantes do golpe de Estado começam a pular fora do barco em uma tentativa desesperada de descolar seus nomes com o de Bolsonaro.
A ideia de Breno Altman de que estamos num momento defensivo é totalmente incongruente com a realidade. Se não há uma mobilização permanente e vigorosa contra o governo há sim uma gigantesca tendência ao desenvolvimento de uma. E é aí que entra a necessidade de uma intervenção política correta por parte das direções do movimento.
É preciso chamar o povo a sair às ruas para derrotar o governo de conjunto, não para lutas parciais. A ideia de que será possível derrotar o governo através de lutas parciais é uma miragem política. As reivindicações parciais estão normalmente relacionadas a uma luta parlamentar, se organiza uma manifestação para frear determinado ataque contando que o Congresso irá se sensibilizar com o clamor do povo.
Isso é uma miragem justamente porque não há espaço para esse tipo de política dentro do Congresso, dominado pela direita golpista cujo objetivo central é passar o trator em cima dos direitos do povo. A palavra de ordem política “fora Bolsonaro”, assim como a defesa da liberdade para Lula, coloca em xeque o regime político golpista de conjunto. Ela aprofunda a crise que está cada vez maior.
Nesse sentido, quando Breno Altman em seu vídeo explica que as “direções políticas não inventam uma rebelião” ele está certo. Mas é preciso completar o raciocínio: o papel das direções política é orientar politicamente o movimento, não reforçando as ideias atrasadas desse momento, mas impulsionando os setores mais avançados. E no caso atual, uma boa parte do povo já está pedindo a derrubada do governo, as direções principais, não. Esse é o problema.
Breno Altman pensa como essas direções políticas que não ouvem o que o povo está pedindo nas ruas. Nesse caso, não é o povo que não se rebela; são as direções que estão paralisadas.