O debate acerca da injúria racial tem colocado em proeminência diferentes posicionamentos quanto a questão do negro e, sobretudo, quanto a compreensão do Estado Burguês como um mediador dos conflitos sociais.
Notícias sobre o tema não faltam. Nesse sentido, vale, aqui, colocarmos em questão duas situações relacionadas à lei de injúria racial. Por um lado, temos conhecimento de que, recentemente, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região, no Rio de Janeiro, pôs fim ao processo de dano moral contra o presidente Jair Bolsonaro por declarações reconhecidas como racistas pelo Ministério Público Federal. Por outro, temos o caso de uma patroa branca que registrou queixa de injúria racial contra a empregada doméstica, também branca, em São Paulo.
No caso de Bolsonaro, o processo se deu após o mesmo dar uma palestra no Clube Hebraica, no Rio. Na época, o então deputado federal, disse que quilombolas não faziam nada e que o mais leve pesava sete arrobas. Bolsonaro, entretanto, chegou a ser condenado, em primeira instância, a pagar R$50 mil de indenização. Ao recorrer, Bolsonaro foi inocentado, por unanimidade, pela 8ª Turma especializada do TRF-2.
Quanto ao caso da empregada doméstica, ocorreu que, ao enviar, por engano, mensagens de áudio ao marido da patroa, ela referiu-se à patroa, dado ao estado de origem da mesma e, também, ao sotaque carregado de expressões tipicamente sulistas, como: “encardida do sul” e “cachorra do sul”. A patroa, Ana Luiza Ferraz, procurou a Polícia Civil de São Paulo e abriu queixa de discriminação racial por parte de uma de suas empregadas. A funcionária, uma mulher de 55 anos, moradora de Taboão da Serra, município da Grande São Paulo, foi demitida. Ana Luiza disse ter percebido um componente racial nas ofensas, uma vez que o parágrafo 3º do artigo 140 do Código Penal qualifica qualquer declaração como injúria racial caso “consista na utilização de elementos referentes a raça, religião, cor, etnia, origem ou até mesmo condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência.”
Dadas as situações expostas acima, pode-se concluir, portanto, que a questão da lei de injúria racial permite, pela sua própria natureza, distintos desdobramentos. É necessário, todavia, colocar a questão sob perspectiva, visto que o judiciário é, em todo caso, – um aparelho do Estado burguês, e que lhe serve como um meio para assegurar o domínio de uma classe sob a outra; sendo parte integrante de uma engrenagem de coerção e sufocamento dos setores oprimidos. Em contrapartida, boa parte da esquerda, através de uma observação metafísica, portanto, idealista, coloca uma instituição como o judiciário, no papel de mediador dos conflitos que, de uma forma ou de outra, expressam a luta de classes. Nessa perspectiva, entretanto, abstrai-se a forma jurídica do Estado burguês de seu conteúdo classista, o que é um erro crasso.
É preciso deixar claro que a lei da injúria racial não resolverá o problema do racismo. O racismo, por sua vez, deve ser combatido nas ruas, através da independência das organizações sociais e não por meio do Estado burguês.