‘Como oficial da Resistência Nacional do Iraque, dou uma ordem de prontidão aos Mujahideen, especialmente ao Exército Imam Mahdi e à Brigada do Dia Prometido[1] – e a quem quer que comande nossa ordem das facções disciplinadas nacionais, para estarem totalmente preparados para proteger o Iraque.’
(Muqtada al Sadr)
Muqtada al Sadr fez essa chamada de reorganização das milícias, ao mesmo tempo em que propôs a constituição de um exército internacional contra os Estados Unidos, logo após o atentado imperialista contra lideranças iranianas e iraquianas e que culminou com o assassinato de, entre outros, Qasem Soleimani (comandante das Forças Quds iraniana) e de Abu Mahdi al-Muhandis, comandante das Forças de Mobilização Popular do Iraque.
O que pareceu uma demonstração de força do imperialismo norte-americano tem-se revelado um erro estratégico tremendo. O ataque dos EUA não gerou outra coisa senão pânico entre os próprios aliados do império e a radicalização de todos os setores do Irã e do Iraque. O que tudo indica é que não está distante a efetivação de uma resistência generalizada dentro do Iraque.
(Muqtada) Al-Sadr é uma personalidade importante do Iraque, enquanto religioso, enquanto comandante de milícias e enquanto político. É fundamental lembrar que a coalizão política liderada por ele, conhecida como Saeroun[2], ficou em primeiro lugar nas eleições gerais do país em 2018. Assim, atualmente ele sustenta uma posição de destaque nas negociações de uma coalizão governamental.
Portanto a convocação feita pelo clérigo iraquiano tem um peso incalculável na mobilização da sociedade, para além das brigadas e milícias ou, mesmo do Exército Mahdi.
Do lado do Irã, que não está tomado pela presença militar norte-americana e europeia – e que vem sofrendo com bloqueios econômicos e constantes ameaças de mais sanções, a reação também foi imediata. O líder supremo do Irã, Ali Khamenei, imediatamente após o atentado contra o comandante Soleimani, afirmou que uma ‘retaliação severa’ deve ser esperada pelos EUA. Khamenei proclamou luto de três dias pela morte do general Soleimani e convocou os encarregados de negócios da Suíça, que representam os interesses dos EUA em Teerã, para protestar contra o assassinato do general iraniano.
Os assassinatos promovidos pelo ataque dos norte-americanos acabou gerando uma tensão muito maior do que a atualmente existente – e não controlada pelos EUA, como imaginavam, de forma que qualquer retaliação do Irã pode acender um conflito que envolveria toda a região, o que coloca em risco as tropas americanas no Iraque, na Síria e alhures. O fato é que Soleimani, nas ultimas décadas, formou uma rede de aliados poderosos e fortemente armados, que se estende até o sul do Líbano, vizinho a Israel.
A televisão estatal iraniana tem afirmado que a ordem do presidente americano, Donald Trump de matar Soleimani teria sido ‘o maior erro de cálculo dos EUA’ desde a Segunda Guerra Mundial: “O povo não permitirá mais que os americanos fiquem na região“.
O sentimento anti-imperialista tende a aumentar e a colaboração entre Iraque e Irã ao invés de enfraquecer tende também a se tornar mais coesa e permanente, contrariando a pretensão norte-americana de dar um fim a ela. Não será surpresa que se estabeleça uma grande frente de resistência no Iraque, uma resistência generalizada no país conforme dito acima, de forma que se tornará praticamente inviável a permanência de forças estrangeiras (europeias e norte-americana) ali.
Pior, como já começou a acontecer, grupos radicais e antipáticos aos norte-americanos, que não estão obrigatoriamente sob comando de governos podem desencadear todo tipo de ataques a alvos ianques e europeus, aliados aos EUA, obrigando a que se retirem de diversos países ou que passem a conviver com tensões e níveis de insegurança que não previam. Mesmo Israel, e a Arábia Saudita, a quem tanto Irã quanto Iraque acusam de colaboração com o governo americano, alvos prioritários de ataques, não esperavam essa subida de temperatura na região.
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NOTAS:
[1] Originalmente chamada de Muqawimun, depois denominado Liwa al-Youm al-Mawud, é uma organização xiita, um grupo insurgente que operou no Iraque a partir de 2008. O grupo foi criado como sucessor do Exército Mahdi, que foi a maior milícia xiita do Iraque até ser dissolvido em 2008, momento em que se dividiu em três milícias – Ketaib Hezbollah (Brigadas do Hezbollah), Asa’ib Ahl al-Haq (Rede Qazali) e a Brigada do Dia Prometido, uma unidade de guerrilha menor que mantem as atividades armadas do Exército Mahdi.
[2] Algo como “marchando adiante”