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Trouxe a modernidade ao tango

Astor Piazzolla, 28 anos da perda do grande inovador do tango

Piazzolla morreu em 4 de julho de 1992. Suas inúmeras contribuições para o desenvolvimento do tango atraíram a atenção de um novo público internacional para o gênero

O dia 4 de julho de 1992 trouxe a triste notícia da morte de Astor Piazzolla, o mais ilustre músico do tango. Foi um herdeiro das tradições do tango, mas tambem o seu maior iconoclasta. Os argentinos costumavam dizer que “na Argentina tudo muda, exceto o tango”. Pois Piazzolla foi o músico que desafiou esta máxima, trazendo inúmeras inovações como influencias da música clássica e jazz e elevando o tango a um novo patamar.

Piazzolla não foi apenas um excepcional e prolífico compositor, mas tambem o seu melhor intérprete, um virtuose do bandoneón, ativo nos palcos em todo o mundo até 1990, dois anos antes de sua morte.

A renovação do tango: 1955

Em 1955 Piazzolla criou o seu grupo Octeto Buenos Aires que foi o veiculo que apresentou sua nova concepção do tango, chamado nuevo tango. Até então o tango era dominado pelas orquestras típicas dos anos 1930 e 1940, fazendo uma música que tinha por propósito principal servir para a dança. O advento do Octeto Buenos Aires se tornou um marco na história do estilo e colocou Piazzolla numa rota de colisão com os tangueros tradicionais.

O octeto era formado por Roberto Pansera (bandoneón, depois substituido por Leopoldo Federico), Atilio Stampone (piano), Enrique Mario Francini e Hugo Baratis (violinos), José Bragato (cello), Aldo Nicolini (baixo acústico, depois substituido por Juan Vasallo) e Horacio Malvicino (guitarra elétrica), alem de Piazzolla no outro bandoneón. O grupo criou um som totalmente novo, sem a presença de um cantor e com sonoridade de um grupo de camara. Na composição de Piazzolla, “Marrón y Azul” de 1955 algumas das novidades eram as improvisações jazzísticas da guitarra de Malvicino e os solos de cello à maneira da música clássica de Bragato, completas novidades dentro do tango.

Infelizmente a resistencia à música de Piazzolla acabou fazendo com que o grupo tivesse poucas oportunidades para se apresentar e seus integrantes foram obrigados a tocar em outras orquestras para completar os seus orçamentos. Finalmente Piazzolla acabou com a banda em 1958, indo para Nova York tentar emplacar sua música por lá.

Piazzolla se cansou das limitações do tango tradicional e fez com que o seu Octeto apresentasse novos ritmos, melodias, timbres e formas, ao mesmo tempo em que preservava a essencia do tango. Ele acrescentou técnicas da música erudita como contraponto, fugas e harmonias complexas, o que causou a ira dos tangueros tradicionais. Anos mais tarde Piazzolla comentou que: “se voce quer mudar o tango, então é melhor voce aprender a lutar boxe ou alguma outra arte marcial”…“minha música carrega o tango, desde o mais primitivo, dos bordéis até hoje”…”voce pode ouvir isso por baixo de tudo. Por cima voce ouve música boa. Mas eu acho que está em meu sangue, eu sou um home do tango”.

Similaridades entre o nuevo tango e o be bop

Neste sentido cabem comparações entre o nuevo tango de Piazzolla e a revolução causada no jazz por Dizzy Gillespie, Thelonius Monk e especialmente por Charlie Parker, quando estes desenvolveram o estilo que acabou sendo conhecido como be bop.

Ambos estilos surgiram em um período de estagnação. No caso do tango servindo apenas como música para dança e no caso do jazz, o swing, que já havia se tornado um estilo dominado por músicos brancos e de caráter bastante comercial e que dominou o cenário musical nos Estados Unidos nos anos 1930 e 1940.

Por volta de 1942 e 1943 Charlie Parker, Dizzy Gillespie, Thelonius Monk e Charlie Christian e muitos outros estavam cansados da tocar sempre o mesmo tipo de música. Esse sentimento era compartilhado com muitos dos melhores músicos negros da época, que começaram a explorar novas possibilidades melódicas e harmonicas. O be bop surgiu como um movimento de reação ao tradicionalismo do swing. Era uma música muito mais rápida e com solos extremamente acelerados e intrincados.

Com o tango aconteceu algo semelhante. Piazzolla adicionou muitas novidades ao tango, muito devido ao seu conhecimento de jazz e música clássica. Seus opositores lhe falavam que sua música não era de fato o tango. Piazzolla respondia que era música contemporanea de Buenos Aires.

Mas enquanto as conquistas sonoras do be bop se traduziram em uma enorme influencia para os músicos das gerações seguintes, seu apelo para o grande público foi pequeno. As estruturas cada vez mais complicadas do genero afastaram cada vez mais o jazz do grande público. No caso de Piazzolla, o nuevo tango atraiu a atenção de um novo público, seduzido pelas melodias irresistíveis, melancolia latente e justamente sua nova complexidade.

Mar Del Plata: 1921, Nova York, 1925

Astor Pantaleón Piazzolla nasceu em 11 de março de 1921 em Mar del Plata, Argentina, filho único de Vicente “Nonino” Piazzolla e Assunta Manetti, ambos imigrantes italianos. A família se mudou para os Estados Unidos em 1925 se instalando no Greenwich Village na cidade de Nova York, na época um bairro violento, com muitos imigrantes operários e dominado por gangsters.

Como os pais trabalhavam duro durante muitas horas do dia o pequeno Astor teve logo que aprender a se virar sozinho nas ruas. Ele mancava na perna direita por conta de um defeito de nascença. Passou por várias operações desde que tinha 2 anos de idade, mas acabou por ficar com uma perna dois centímetros mais curta que a outra. Desde pequeno aprendeu a apreciar o tango, especialmente os discos de Carlos Gardel e Julio de Caro, alem de música clássica e jazz, que ouvia no rádio. Seu pai lhe presenteou com um bandoneón quando ele tinha oito anos de idade, comprando-o em uma loja de roupas de segunda mão.

O bandoneón foi inventado na Alemanha nos anos 1830. Era um instrumento da mesma família que o acordeão, mas muito mais difícil de ser tocado. Foi criado por músicos de igreja que eram muito pobres para comprar um harmonium ou um orgão. Chegou à Argentina pelas mãos de marinheiros alemães e foi logo incorporado pelos músicos de tango.

Com a chegada da Grande Depressão em 1929 a família Piazzolla decide voltar para a Argentina. Mas a depressão chegou tambem à Argentina e apenas nove meses depois os Piazzolla estavam de volta a Nova York. Lá Astor compõe seu primeiro tango, “La Catinga”.

Em 1934 ele conhece seu grande ídolo, Carlos Gardel, que estava na cidade fazendo o seu filme “El Dia Que Me Quieras”. Impressionado com a musicalidade de Astor, Gardel o convida a fazer parte de sua banda. Para a tristeza do jovem o pai Vicente o proibe por ele ser muito jovem.

Mas no final das contas foi uma boa decisão de Vicente, já que justamente nessa turnê Carlos Gardel e todos os seus músicos perdem a vida em um desastre de avião. Anos depois Piazzolla lembrou do evento: “se meu pai tivesse me deixado me juntar à turnê eu estaria tocando harpa, ao invés do bandoneón.”

De volta à Argentina, 1936

Na volta para Mar del Plata Astor, então com apenas 17 anos, começa a tocar em várias orquestras de tango. Em 1941 seguindo o conselho do pianista Arthur Rubinstein começa a ter aulas com o grande compositor erudito Alberto Ginastera. Astor mergulha no estudo de compositores como Bela Bartók, Maurice Ravel e Igor Stravinsky. Ficou cinco anos estudando com Ginastera, o que lhe trouxe um grande domínio da orquestração. Em 1943 começou a estudar piano com Raul Spivak, algo que se prolongaria por mais cinco anos. Nesse período escreveu seus primeiros trabalhos eruditos como o “Preludio Nº 1 para violino e piano” e “Suite para cordas e harpa”.

Faz suas primeiras gravações entre 1946 e 1948 como Astor Piazzolla Y Su Orquestra Tipica. Lança 16 discos de 78 rotações. Em 1950 desfaz a orquestra e decide abandonar o tango e estudar apenas a música erudita. Para isso viaja para Paris em 1954 para estudar com a famosa Nadia Boulanger no Conservatório Fontainebleau. Boulanger foi professora de inúmeros grandes músicos, de Michel Legrand, Quincy Jones e Darius Milhaud a Lalo Schiffrin e Aaron Copland, entre muitos outros.

Boulanger ouviu as composições que Piazzolla lhe mostrou e disse que ouvia traços de Ravel, Stravinsky, Bartók e Hindemith, mas não de Astor Piazzolla. Ele ficou envergonhado. Finalmente ele confessou: “olha, Nadia, eu toco tango”. Ela retrucou: “eu amo tango”. Então Astor tocou um de seus tangos, “Triunfal” para ela. “Isto é o verdadeiro Piazzolla! Nunca se esqueça disto!”.

Com sua confiança restaurada por Boulanger Astor assinou contrato com tres gravadoras francesas e a compor muitos tangos, dentre eles “Picasso”, “Marrón y Azul” e “Rio Sena”. Em 1955 saiu o seu primeiro LP, gravado em Paris: “Sinfonia de Tango”, creditado a Astor Piazzolla, Su Bandoneon Y Sus Cuerdas”, gravado com a orquestra da Opera de Paris. Por esta época Piazzolla já tinha se tornado o músico argentino mais conhecido na França.

Nova York, 1959

Depois do período de lançamento do nuevo tango, de 1955 a 1958 e de ter encerrado as atividades do seu Octeto, Piazzolla foi para Nova York, mas teve muito pouco sucesso por lá. Gravou apenas um disco com músicos americanos, “Take Me Dancing!”, uma mistura de jazz e tango que não deu certo. Mas nesta época recebeu a notícia da morte de seu pai, Vicente “Nonino”. Devastado, ele foi para a cozinha da casa e em 30 minutos compos uma de suas músicas mais famosas, “Adios Nonino”, baseada em outra música sua de 1954, “Nonino”.

De volta à Argentina entrou em sua fase mais criativa. Formou o seu primeiro Quinteto, composto por bandoneón, guitarra, baixo acústico, piano e violino, uma formação que ele constatou ser a mais apropriada para o seu estilo de tango. Até 1973 lançou inúmeros discos notáveis como “El Tango” (em colaboração com Jorge Luis Borges), “Maria de Buenos Aires” (1968) e “Balada Para Um Loco” (1969). Em 1973 sofreu um ataque cardíaco. Após se recuperar se mudou para a Itália, continuando com uma série de discos extraordinários como “Libertango” (1974) e “Suite Troileana” (1976).

Infelizmente em 1990 ele sofreu um derrame cerebral em Paris, que o deixou em coma e morreu em Buenos Aires.

Ao longo de sua vida escreveu algo em torno de 3000 composições e chegou a gravar mais de 500 músicas.

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