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Eduardo Vasco

Militante do PCO e jornalista. Materiais publicados em dezenas de sites, jornais, rádios e TVs do Brasil e do exterior. Editor e colunista do Diário Causa Operária.

Tensões sírio-turcas

Estaria o imperialismo retomando o controle político da Turquia?

Após se distanciar da influência imperialista durante alguns anos, o presidente Erdogan adota uma postura que atende aos interesses imperialistas de desestabilizar o Oriente Médio

Por Eduardo Vasco

Voltaram a escalar as tensões entre Turquia e Síria. A região de Idlib é o palco dos combates. O governo do presidente Recep Tayyip Erdogan mantém forças militares – exército e aeronáutica – no território sírio para apoiar guerrilheiros opositores de Bashar al-Assad.

Os embates têm se intensificado e a Rússia – aliado fundamental da Síria em sua guerra contra o Estado Islâmico, outros grupos armados promovidos pelo imperialismo e a própria intervenção imperialista direta – tomou partido de Damasco contra os turcos, dos quais se aproximaram intensamente nos últimos anos.

Já houve troca de ataques entre sírios e turcos, e mesmo entre turcos e russos, embora estes últimos tentem mediar a situação.

Para fazer qualquer esboço de análise sobre a complexa situação na qual se encontra a política externa turca atualmente, entretanto, é preciso voltar um pouco no tempo.

As oscilações de Erdogan

Erdogan foi consolidando seu poder na Turquia desde sua ascensão como primeiro-ministro, em 2003. Durante o período que se encerrou em 2014, quando se elegeu presidente, a Turquia manteve uma firme aliança com o imperialismo, sendo fortemente cogitada para integrar a União Europeia e considerada um país democrático em comparação com as outras nações de maioria islâmica.

Em 2011, os turcos foram responsáveis por iniciar a desestabilização e finalmente a guerra na Síria, junto com outros países do Oriente Médio, como Catar e Arábia Saudita, com o imperialismo por trás, armando e financiando “rebeldes” para derrubar Assad.

No entanto, tudo mudou após julho de 2016, quando militares apoiados pelos Estados Unidos e a OTAN tentaram um golpe de Estado contra Erdogan, que não caiu graças à ajuda da inteligência russa e da reação popular nas ruas, respondendo com um violento expurgo no interior das forças armadas para enfraquecer os setores pró-imperialistas.

A partir daí, a política externa turca mudou consideravelmente. Os EUA foram perdendo cada vez mais terreno para a Rússia e Erdogan se aliou a outros governos nacionalistas pelo mundo, como a Venezuela de Maduro.

Mas seu governo continuou mantendo fortes contradições, tanto interna como externamente.

Defesa das fronteiras e agressões militares

Um episódio que reflete bem essas contradições, no caso externas, do governo turco, foi a Operação Ramo de Oliveira. Em janeiro de 2018, o exército da Turquia invadiu o noroeste da Síria, ocupando a região de Afrin sob a desculpa de combater as forças separatistas curdas, que constituiriam uma ameaça à sua integridade territorial.

A invasão foi fortemente denunciada pelo governo sírio e pela Rússia. Os próprios Estados Unidos não a viram com bons olhos, uma vez que naquela oportunidade as suas relações com a Turquia não estavam em alta e uma ação turca visava esmagar aqueles que estavam sendo treinados por Washington para confrontar o exército sírio em sua última tentativa de derrubar Assad. É importante lembrar que naquela ocasião o Pentágono já mantinha bases militares no noroeste da Síria, sob os protestos de Damasco.

Na prática, Turquia e Síria lutavam contra um inimigo em comum: os curdos, que buscam constituir uma nação independente e para isso precisam de partes territoriais que hoje pertencem aos dois países, além do Iraque. Logo, o correto seria se aliarem. Mas não foi o que ocorreu e o exército turco permanece até hoje na região, financiando organizações armadas radicais sunitas contra as forças armadas do governo sírio.

Esse dado é importante. O governo sírio, ao contrário dos outros governos do Oriente Médio, é laico e secular. Assad é alauíta, uma vertente do xiismo. O principal aliado da Síria na região é o Irã, xiita. Assim, tal aspecto do conflito sírio-turco se insere na disputa geopolítica regional, na qual Irã e Turquia disputam – junto com a Arábia Saudita – para ver quem consegue alcançar maior influência entre os países, povos e movimentos armados.

Erdogan está tratando as regiões no noroeste da Síria, com presença militar turca (Afrin e Idlib), como se fossem territórios da Turquia. Ele tem feito sérias ameaças contra Bashar al-Assad caso as suas tropas sejam atacadas e prometido reagir violentamente às mortes de seus soldados pelas forças de Damasco. Ora, mas o agressor é justamente a Turquia! A Síria está apenas se defendendo de uma invasão ilegal.

Na atual etapa do conflito, Erdogan está apelando a discursos nacionalistas para reforçar sua base de apoio interna. Os sentimentos ufanistas sempre foram utilizados pelo imperialismo ao longo da história para jogar um povo contra o outro. Países que, um dia, já foram potências regionais, são ainda mais suscetíveis a isso, pois seus setores mais atrasados ainda têm alguma ambição reacionária de voltar à antiga condição reconquistando territórios perdidos. Basta lembrar da Guerra da Iugoslávia, quando forças reacionárias sérvias se aproveitaram da situação em que o imperialismo financiava de alguma maneira todos os lados do conflito e falavam em reconstruir a “Grande Sérvia” e até mesmo alguns albaneses chegaram a cogitar uma “Grande Albânia”.

Ou então a guerra entre Irã e Iraque na década de 1980, quando dois governos nacionalistas se digladiaram ao invés de se unirem pelo interesse comum que era expulsar o imperialismo do Oriente Médio. Ou mesmo os frequentes conflitos territoriais que duram desde o final dos anos 1970 entre a China e o Vietnã. A própria China e a União Soviética caíram nessa trama, logicamente com o imperialismo tendo um papel obscuro na fustigação dessas escaramuças.

O Império Otomano, cujo centro era o que hoje é a Turquia, foi uma fortíssima potência regional que abrangeu, em diferentes momentos históricos, partes da África do Norte, do Sudeste Europeu e do Oriente Médio. Certamente, com o crescimento da Turquia como um “país emergente”, isto é, devido à política nacionalista de Erdogan que levou o país a um relativo desenvolvimento econômico – e à força militar turca –, há diversos setores retrógrados que anseiam pela volta de uma “Grande Turquia”.

É de se recordar que o norte da ilha de Chipre é controlado pelos turcos – a Turquia é o único país que reconhece a independência do Chipre do Norte, após a invasão de 1974. Ou seja, trata-se de um território ocupado pela Turquia. Por sua vez, além da invasão da Síria desde 2018, Ancara está empreendendo uma nova intervenção em terras estrangeiras, e agora longe de suas fronteiras: na Líbia.

É difícil de saber, entretanto, até que ponto todas essas investidas representam os interesses nacionais da Turquia e até que ponto não servem à política do imperialismo de utilizá-la para seus próprios interesses.

A Turquia se reaproxima das potências imperialistas

Os turcos são o maior exército da Organização do Tratado do Atlântico Norte. Teriam condições de se protegerem por conta própria sem precisar estar sob a bota dos militares dos países imperialistas que controlam a OTAN. No entanto, mesmo quando sofreu a tentativa golpista de 2016 promovida pelo imperialismo, Erdogan não se retirou da Aliança.

No final de fevereiro, a Turquia solicitou uma reunião no âmbito do Artigo 4º do Tratado de Washington, que estipula a assistência dos países da OTAN a um membro que veja sua segurança nacional ameaçada.

A ajuda militar da OTAN à Turquia contra a Síria só não ocorreu até agora por causa do veto da Grécia. Além da rivalidade histórica entre helenos e otomanos (à qual o Chipre está incluso), os gregos exigem que a Turquia impeça a passagem em massa de refugiados para a Europa, o que afeta primeiramente a Grécia devido à sua posição fronteiriça.

A fronteira com a Europa é o principal instrumento de barganha de Erdogan com a União Europeia, tanto para acordos benéficos à Turquia como para a política que vem de anos de ingresso de seu país ao bloco continental.

O país sempre foi um ponto estratégico do imperialismo, especialmente durante a Guerra Fria. Quando da Crise dos Mísseis, todos culparam a União Soviética por quase ter desencadeado uma guerra nuclear ao instalar arsenal em Cuba, mas poucos se lembram que isso foi apenas uma resposta à instalação de mísseis nucleares norte-americanos na Turquia, apontados para a URSS.

Após o golpe fracassado de 2016, Erdogan preferiu comprar o sistema de mísseis S-400 russos ao invés do Patriot dos EUA. Porém, diante da invasão à Síria a qual não é apoiada por Moscou, a Turquia está buscando finalmente armamento norte-americano.

As tensões políticas e diplomáticas entre Turquia e Rússia têm se intensificado ao ponto de a polícia turca ter prendido, neste final de semana, jornalistas da agência de notícias russa Sputnik em Istambul e Ancara. Esse episódio apenas aumentou a crise entre os dois países.

Aparentemente o imperialismo está tentando enfraquecer a aliança formada entre Turquia e Rússia e, ao mesmo tempo, provocar um conflito na Síria que sirva de pretexto para retomar uma intervenção no país árabe após a derrota que sofreu para a Síria, o Irã e a Rússia. Isso afeta diretamente outro inimigo do imperialismo, o Irã, que tem lutado para estabilizar a região e aumentar sua influência, cujo ponto máximo até o momento foi justamente a vitória na Síria.

Além disso, a cooperação econômica da Turquia com a Rússia entra em contradição com os interesses dos Estados Unidos. O Turkstream, gasoduto que levará gás russo à Europa através da Turquia, está a ponto de ser inaugurado, o que é um duro golpe aos monopólios norte-americanos do gás.

É preciso acompanhar detalhadamente o desenvolvimento da situação no Oriente Médio e a crise entre Síria e Turquia, bem como os passos dados por Erdogan na política externa e interna, para tirar qualquer tipo de conclusão. Todavia, o que não pode restar dúvidas é o fato de que o imperialismo age de todas as maneiras possíveis para retirar a autonomia política dos governos nacionalistas, extremamente suscetíveis de sofrerem pressões para que atendam aos interesses das grandes potências capitalistas.

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