Por Eduardo Vasco
O coronavírus chegou ao Brasil para fragilizar ainda mais o já abalado regime golpista. A burguesia está em pé de guerra entre seus setores, o que é visível nos conflitos de Bolsonaro com o Congresso e com a imprensa. Logicamente, trata-se não de um combate por motivações ideológicas, mas pragmáticas, com a burguesia e o imperialismo tentando manobrar para consertar o governo caótico e incapacitado de Bolsonaro. Não é o duelo entre uma ala fascista e uma ala democrática (e menos ainda antifascista), mas sim entre duas alas fascistas, em última instância – será um crime esquecermos que foram os mesmos personagens do Congresso e da imprensa golpista que levaram Bolsonaro ao poder.
A crise política é enorme. Por sua vez, a crise econômica se acentuou radicalmente com o impacto da pandemia sobre os setores da especulação financeira mundial. As bolsas caem por todo o globo e o Brasil tem sido duramente afetado por isso. Particularmente o real, moeda mais desvalorizada desde o início do ano. Ele já vinha sendo degradado em relação ao dólar em 2019, mas o coronavírus deu um empurrãozinho para que ele chegasse, na semana passada, a alcançar o valor de cinco para um se comparado à moeda norte-americana.
Por último, a crise social é a mais grave de todas. Os serviços públicos, completamente devastados desde o início da ofensiva golpista que derrubou a ex-presidenta Dilma Rousseff e que levou o governo bolsonarista a terminar de exterminá-los, não têm a menor capacidade de lidar com o COVID-19. O sistema de saúde pública foi aniquilado pela política neoliberal de Bolsonaro e, agora que os brasileiros mais precisam dele, estão condenados a morrerem aos montes porque o regime ditatorial do presidente fascista não irá fazer absolutamente nada para recuperar o mínimo de eficiência, uma vez que quase tudo ou foi entregue para a iniciativa privada ou foi sucateado ao ponto de que o Estado precisaria reerguê-lo – coisa que Bolsonaro não está minimamente disposto a fazer, uma vez que sua política atende integralmente aos interesses dos capitalistas.
Esse quadro indica que as condições objetivas para a derrubada de Bolsonaro estão maduras. Por outro lado, as condições subjetivas também se encontram favoráveis, uma vez que o presidente fascista é repudiado pela esmagadora maioria da população e os gritos de Fora Bolsonaro já não podem ser escondidos nem mesmo pela imprensa burguesa. Essa palavra de ordem tomou conta das ruas, das redes sociais, das discussões de boteco e de família.
O 8 de Março foi a comprovação definitiva disso. Não houve quase nenhuma organização que não aderiu ao Fora Bolsonaro, mesmo aquelas que sempre mantiveram uma posição centrista ou mesmo direitista a respeito da luta contra o governo.
Entretanto, ao invés de aproveitar a efervescência popular antigovernamental, a esquerda simplesmente regrediu de uma maneira criminosa com relação à mobilização. Os atos marcados para o sábado (14) e a quarta-feira (18) foram cancelados – “adiados”, “suspensos”, no palavreado demagógico desses setores. A desculpa foi o perigo do coronavírus.
Quem encabeçou essa traição à luta contra Bolsonaro foram, em primeiro lugar, as centrais sindicais artificiais e pelegas (Força Sindical, UGT, CSB, NCST) e, em segundo lugar, o PCdoB, que controla a CTB e a UNE. Essa coalizão, que pode ser entendida como uma espécie de frente ampla, boicotou os atos de rua do dia 18 e obrigou que fossem cancelados, ao pressionarem a direção centrista da CUT. Já os atos nacionais do dia 14 tiveram o PSOL como o grande sabotador, uma vez que – embora não fosse nem de longe a organização que lavasse as massas às ruas, por não ter força para isso – era o grande articulador dos atos, em lembrança ao assassinato de Marielle Franco, ex-vereadora do partido, pelos fascistas.
A mobilização popular, de nítida tendência ascendente, foi simplesmente abortada pela ação covarde dessas organizações. O pretexto é assegurar a proteção das pessoas, a fim de que não se aglomerem para evitar a propagação do vírus. No entanto, esquecem-se que não é cancelando manifestações que se impedirá as grandes concentrações populacionais, porque, apesar da propaganda da imprensa e do governo e as proibições ditatoriais de eventos públicos, os trabalhadores continuarão se amontoando no transporte público e nos locais de trabalho.
Ou seja, ao invés de organizar a revolta popular contra o governo que obriga a população a se expor ao vírus com potencial mortífero, a esquerda capitula diante dele para, em sua fábula pequeno-burguesa, defender a saúde do povo.
A extrema-direita, no entanto, foi às ruas nesse domingo (15), mesmo contra a propaganda da maior parte da burguesia – imprensa, órgãos governamentais, políticos. Seus atos poderiam ter sido um pouco maiores se não fosse o temor do coronavírus, mas provavelmente não teriam deixado de ser esvaziados, justamente porque, ao contrário dos coxinhatos pró-impeachment, não contaram com o apoio massivo do Estado, da imprensa e dos grandes capitalistas. Mesmo assim, ela demonstrou estar radicalizada, disposta a defender uma política netamente fascista.
Os fascistas não tiveram medo do coronavírus, não se sabe se mais por ignorância ou mais por convicções políticas. A esquerda, sim. E o medo da esquerda não foi com relação ao povo, mas com relação a ela mesma. Se se preocupasse com o povo, teria ido às ruas e permaneceria nas ruas, porque somente a mobilização popular pode mudar o cenário atual de caos social causado pelo coronavírus e seus impactos no sistema de saúde e pela crise econômica.
A esquerda pequeno-burguesa vai ficar em casa e seguir as recomendações do regime bolsonarista. Os trabalhadores, por sua vez, terão de ir trabalhar e se aglomerar no transporte e nos locais de trabalho, porque é isso o que Bolsonaro exige, para garantir os lucros dos grandes capitalistas que o financiam.
É uma política suicida e de total complacência ao massacre que ocorrerá contra o povo, principalmente os mais pobres, indefesos diante da propagação do vírus, sem serviços públicos de saúde que os atendam, sem possibilidade de escapar de grandes concentrações, sem nenhum recurso para contornar a crise econômica.
O que deve ser feito é o contrário do que prega a esmagadora maioria da esquerda. Os que defendem o povo devem sair às ruas para que os direitos e interesses populares sejam garantidos. O principal deles, que aglutina todas as reivindicações imediatas, é justamente o Fora Bolsonaro. A campanha de agitação e propaganda, ao contrário de estagnar e refluir – como quer parte da esquerda –, deve se intensificar!
É indubitavelmente necessário fortalecer as atividades e ações no seio da classe trabalhadora, principalmente agora que o povo entende claramente que Bolsonaro não fará nada para conter o coronavírus ou as crises que atingem as camadas mais desfavorecidas da população. O descontentamento popular tende a aumentar significativamente conforme a crise sanitária, econômica e social se aprofunda.
Percebendo a gravidade da situação, o Partido da Causa Operária elaborou um programa de emergência com 32 pontos, que englobam todos os interesses imediatos da população e abrem o caminho para a superação da crise que atinge os trabalhadores para que os capitalistas não paguem por ela. Pelo contrário, o que propõe o PCO é que seja a burguesia, criadora da crise, que pague por ela, e não o povo. Esse programa pode ser lido e compartilhado a partir deste artigo escrito pelo presidente do Partido, Rui Costa Pimenta.