Neste domingo (19), ocorre o segundo turno das eleições colombianas. Seja qual for o resultado, o principal cenário que devemos considerar é a grande polarização do país. Estão concorrendo um candidato mais à esquerda, Gustavo Petro; e outro da extrema-direita, Rodolfo Hernández.
A disputa está bastante acirrada, segundo as pesquisas eleitorais. Há uma semana, Hernández somava 48,2% contra 46,5% de Gustavo Petro. Um empate técnico, portanto. Petro venceu o primeiro turno com 40,3% dos votos e Rodolfo Hernández alcançou 28,1%, cinco pontos à frente do candidato do governo, Federico Fico Gutiérrez, com 23,9%, que declarou apoio a Hernández assim que se viu derrotado. A soma dos dois candidatos supera Petro.
Ainda que Brasil e Colômbia vivam situações distintas, é possível traçar alguns paralelos entre os dois casos. Houve uma intensa campanha na imprensa, notadamente a independente, aqui no País, que dava como certa a vitória de Petro ainda no primeiro turno, assim como vêm fazendo no caso da candidatura Lula.
Esse tipo de pensamento é uma armadilha, pois, de certa maneira, tem o poder de desmobilizar a esquerda que entra em um clima de “já ganhou” e, portanto, coloca menos energia na campanha. Por outro lado, mobiliza a direita em torno de um candidato com maior chance de vitória.
Em outras palavras, se a burguesia quiser fazer migrar os votos de Bolsonaro para a Terceira via, pode usar o “Lula vence no primeiro turno” para induzir os eleitores a procurarem uma candidatura mais viável, ou com mais chances de vencer o petista em um eventual segundo turno.
Na Colômbia, a direita soube como manobrar. Lançou candidatos que tiraram votos de Petro à direita e à esquerda. No Brasil, temos uma situação semelhante com candidaturas à la Ciro Gomes, PCB e UP. A imprensa tratou Gustavo Petro como ex-guerrilheiro, ainda que sua passagem pela guerrilha não tenha sido marcante. Por aqui, temos uma intensa campanha na imprensa capitalista contra o ex-presidente Lula, que já estão tentando ligar a um contador com uma suposta ligação com o PCC.
Como será a governabilidade?
Mesmo que Gustavo Petro vence, embora isso não pareça provável, pois a Colômbia virou uma Israel na América do Sul; é preciso pensar em que termos se dará seu governo. Ainda que não se trate exatamente de um candidato de esquerda, é difícil acreditar que os EUA permitirão seu governo de maneira tranquila. Para isso, seria preciso uma alta participação popular nas ruas para garantir um governo Petro cada vez mais à esquerda.
A Colômbia tem sido usada pelos Estados Unidos para manter bases próximas à Amazônia, bem como pressionar o governo venezuelano. Se um eventual governo Petro tentar uma aproximação com Venezuela ou Cuba, podemos esperar períodos de grande turbulência.
Guerra ao narcotráfico
A desculpa dos americanos para fixar bases na Colômbia foi a propagandeada “guerra ao narcotráfico”. A “guerra” foi tão bem-sucedida que hoje se produz muito mais drogas que antigamente. Quando se trata dos EUA, isso nem chega a ser novidade, conforme já noticiou este Diário: a produção de ópio aumentou em 40 vezes após a ocupação imperialista no Afeganistão.
A violência do governo colombiano, por meio de forças regulares ou paramilitares, já assassinou mais de 70 líderes sociais somente neste ano, e ainda estamos na metade de junho! E ainda existe a perseguição de ativistas por parte do Ministério Público, acusando-os – sem provas – de estarem ligados a grupos insurgentes.
O grande erro da guerrilha colombiana foi acreditar no governo e ter deposto as armas. Por conta disso, estão sendo assassinados aos montes.
Radicalização
A vitória de Petro no primeiro turno das eleições colombianas demonstram que há uma grande radicalização. Mesmo com a ameaça de atentados, houve grandes manifestações, o que mostra que a população está disposta à luta.
Resta saber até que ponto essa radicalização se manifestará com a vitória de Petro ou de Hernández. Ao que aparenta, existe uma tendência das massas de ultrapassarem um possível governo de Gustavo Petro, bem como entrar em choque no caso de a vitória ficar com Rodolfo Hernández.
A votação mostrou que há uma forte rejeição a candidatos identificados como governistas. Hernández passou para segundo turno porque fez uma campanha despolitizada, tentando se mostra como alguém de fora da política, antissistema. E própria imprensa cuidou de tratá-lo como uma pessoa pitoresca.
Por outro lado, Hernández já recebeu apoio de Fico. Ou seja, sua imagem de outsider, alguém “de fora” do sistema, ficará difícil de sustentar.
Crise
A atual tendência inflacionária e deterioração da qualidade de vida têm levado a população a se revoltar em toda a América Latina. No Chile, a popularidade de Boric despenca e o queridinho da esquerda psolista já decretou estado de sítio contra os índios Mapuche. No mesmo sentido, no Equador, o governo decretou estado de emergência devido às manifestações dos indígenas do país.
Nos Estados Unidos, a coisa não parece ser muito diferente. A popularidade de Joe Biden é muito baixa e, ainda por cima, uma grande possibilidade de ficar sem maioria no Congresso no final do ano assombra a Casa Branca. Essa fragilidade pode ser mais um motivo pelo qual os Estados Unidos não abririam mão de eleger um candidato seu na Colômbia. Porém, com o acirramento da polarização política no país, e mesmo na América Latina, todas as cartas ainda estão na mesa.