Em entrevista concedida ao “O Globo” no último domingo (01), Armínio Fraga, notório porta-voz da burguesia imperialista no Brasil, deixou claro, através das inúmeras restrições apontadas, que Bolsonaro está perdendo apoio até mesmo entre os principais agentes do golpe de 2016.
Fraga demonstra que, para a burguesia, a instabilidade política gerada pelo golpe está longe de ser superada. Pelo contrário, o governo Bolsonaro é visto com crescente preocupação pela burguesia, como um fator de acirramento desta instabilidade:
“O quadro geral inspira cuidados. (…) Esse clima afeta as decisões das empresas e das pessoas, e representa um retrocesso no desenho de país que temos que construir. Há no ar também uma certa forma truculenta de agir. O aparelho de Estado não pode ser pressionado ou usado para ameaçar pessoas.”
Como é natural, a instabilidade política leva à polarização crescente da sociedade, justamente o que a burguesia mais teme, já que a polarização política deixa evidente a polarização natural de uma sociedade de exploração. Tornam-se claros, aos olhos do povo, os campos em luta.
Preocupado com esta situação, Fraga fala em diminuir a “imensa desigualdade” existente na sociedade:
“É fundamental tratar da nossa imensa desigualdade. E não é uma questão “apenas” de cunho social, como se isso não bastasse, mas vai além. Um trabalho mais profundo nesta área teria consequências positivas para o crescimento. (…) É algo que, se não tratado, vai continuar a polarizar o nosso país, vai nos fazer vítimas fáceis de populismo e, portanto, tem um impacto indireto gravíssimo sobre a capacidade de o Brasil melhorar.”
É evidente que a burguesia não tem nenhuma preocupação de cunho humanitário. Fraga foi justamente o principal cúmplice dos piores crimes do governo FHC contra o povo, que levou a desigualdade a um grau tão grande intensidade, que por pouco não ocorre uma explosão social
O que as palavras de Fraga demonstram, entretanto, é que o imperialismo está consciente de que a instabilidade política crescente tende a levar o país a uma ruptura social capaz de ameaçar a própria burguesia.
É o que Fraga chama de “populismo”, clássico jargão da burguesia para esconder o que realmente lhe coloca receio: que a crise política e econômica leve o povo a perceber que a solução de seus problemas passa necessariamente pela radicalização revolucionária da luta.
Considerando que, no que se refere à democracia, o “retrocesso já aconteceu”, e “o risco é que piore mais ainda”, Fraga demonstra todo o descontentamento da burguesia com a condução política do país, utilizando-se do exemplo da questão da Amazônia:
“Por exemplo: o tema da Amazônia está nas manchetes do mundo inteiro. A maneira como o assunto vem sendo conduzido (pelo governo) desde seu início afeta decisões em outras áreas. As pessoas param para pensar. Será que o que nós estamos vendo no meio ambiente e na educação vai se repetir em outras áreas? É claro que é possível. Está tudo muito imbricado com a questão maior do investimento, da confiança, até mesmo do gasto das pessoas, que ficam com medo. Além disso, o Brasil segue com um desemprego muito alto, muita gente vai ficando para trás e o ambiente de negócios fica prejudicado.”
Fraga termina seu pensamento com uma frase que pode soar como uma verdadeira ameaça da burguesia capitalista ao governo Bolsonaro:
“Muita gente elogia a economia publicamente, mas não investe.”
A preocupação com o descrédito da Lava Jato também é clara. Fraga coloca na conta dos hábitos de baixo clero parlamentar de Bolsonaro a desarticulação da operação imperialista:
“As tensões aumentaram, com grupos claramente procurando atrapalhar o funcionamento da Lava-Jato. Mais recentemente, questões ligadas à família do presidente criaram uma “aliança” surpreendente contra as investigações, contraditória em relação ao que se viu na campanha. As instituições têm sido severamente testadas.”
Apesar de todas as críticas, entretanto, o discurso de Fraga demonstra que se a burguesia ainda tende a querer colocar Bolsonaro “na linha”, a entrevista concedida justamente a um dos meios de comunicação mais diretamente ligados ao imperialismo, que é o Globo, e por meio de um de seus mais qualificados porta-vozes, como é o pajem econômico do “príncipe” Fernando Henrique, já estamos passando para o momento em que as ameaças da burguesia tendem a ficar mais contundentes.
A entrevista de Fraga é sintoma – já em forma de ameaça – de que a alta-burguesia imperialista espera que Bolsonaro “entre na linha” imediatamente, ou seja, que coloque um fim na instabilidade política, e o faça logo.