Por Victor Assis
Os heróis da esquerda pequeno-burguesa costumam ter um prazo de validade, em média, de dois anos. São cobertos de elogios, recortados e colados ao lado de fotos de pessoas que nunca ouviu falar e procuram lhe convencer de que, na verdade, sempre estiveram ao lado do povo. Na eleição seguinte, o enredo se repete, e o mesmo uniforme é utilizada por um novo herói.
Como exemplo dessa volatilidade dos heróis, basta ver os exemplos do PDT e do PSB. Em 2016, o PSB era um partido vilão, traidor, que após lançar uma candidatura própria à Presidência da República e apoiar Aécio Neves nas eleições presidenciais, pediu o impeachment da presidenta Dilma Rousseff. O PDT, por outro lado, era o fiel PDT, a herança do trabalhismo varguista, que esteve — supostamente — com o PT até o fim de seu governo. Em 2018, no entanto, os partidos trocaram de máscara: o PSB virou um grande aliado da luta contra o fascismo — de modo que a direção do PT decidiu rifar a candidatura de Marília Arraes, em Pernambuco, para apoiar Paulo Câmara — e o PDT cuspiu no prato em que comeu, com direito a uma férias imprevista do abutre Ciro Gomes.
Com a pandemia do coronavírus, o tempo de validade da nobreza — e também da vilania, ao que parece — foi fortemente abalado. Wilson Witzel (PSC-RJ), denunciado outrora como um genocida por metralhar o povo pobre do alto de um helicóptero, João Doria (PSDB-SP), odiado por roubar a aposentadoria de todos os servidores públicos de São Paulo, Ronaldo Caiado (DEM-GO), conhecido veterano das ligas fascistas do campo brasileiro, Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS), demolidor do Sistema Único de Saúde (SUS), entre tantos outros vilões, foram alçados a categoria de grandes heróis do povo. O povo brasileiro, por outro lado, tratado com tanto estimo pela esquerda pequeno-burguesa quando portador de seu título de eleitor, passou a ser o grande vilão da saúde pública: se o coronavírus se espalhasse pelo país, seria por culpa da ignorância da população.
Eis que, no entanto, os novos heróis não se deram muito bem com seu novo uniforme. Doria, Caiado, bem como Ratinho Jr. (PSD-PR), Eduardo Leite (PSDB-RS) e todos os demais governadores estão provando que, no fim das contas, proteger a população do coronavírus nunca foi seu real objetivo. Sob a pressão de seus verdadeiros patrões — isto é, os capitalistas —, todos os governadores estão se encaminhando para liquidar com a política do isolamento social. Isto é, estão mostrando que, entre a vida da população e o lucro dos capitalistas, esse último é a prioridade. E detalhe: decidem isso justamente quando o número de casos no Brasil está ainda crescendo, sem sequer conhecer o seu pico. Trata-se, portanto, de um crime ainda maior contra o povo brasileiro do que o que está sendo cometido pelos governos italiano e espanhol, que optaram por uma flexibilização da quarentena após o número de mortos por coronavírus por dia ter reduzido consideravelmente.
O retorno dos heróis do povo a condição de assassinos não surpreende. Essa, inclusive, sempre foi sua posição: a de determinar o isolamento social apenas para que o regime político se recompusesse para evitar uma explosão social. O fim da quarentena sempre esteve em seus cálculos, e é sem qualquer peso na consciência que irão lançar os pulmões de milhões e milhões de brasileiros para o contato direto com um vírus altamente contagioso e que mata 5% daqueles que o hospedam.
Com os heróis do povo desmascarados, é preciso, portanto, partir para uma política completamente independente em relação à burguesia. Afinal de contas, a aliança criminosa com a direita golpista é o que está impedindo os trabalhadores de chegarem à única solução para a crise imposta pelo coronavírus: a derrubada imediata do governo Bolsonaro.