Em entrevista ao Jornal Brasil Atual no dia 10 de junho, Guilherme Boulos, coordenador nacional do MTST e ex-presidenciável pelo PSOL, fez um balanço dos atos convocados no dia 7 contra o governo Bolsonaro. Uma declaração que chamou atenção de nossa redação e que será o centro dessa polêmica foi a de que o ato convocado pelo próprio Boulos no Largo da Batata teria cumprido um papel importante na luta contra o fascismo:
Quando o fascismo toma as ruas livremente, cria um clima de medo, um ambiente de agressão, de ódio. Então, construiu-se um contraponto. Ficou claro neste domingo que existe uma muralha para barrar o fascismo no Brasil.
Os acontecimentos envolvendo Guilherme Boulos no dia 7 não apontam, contudo, para a formação de uma “muralha” contra o fascismo. O psolista, naquele dia, capitulou para a pressão do governo Doria e para a Polícia Militar, decidindo cancelar o ato que estava marcado para acontecer na Avenida Paulista e convocando uma manifestação no Largo da Batata. O tal Largo da Batata, além de não ser um lugar tradicional de luta da classe operária, fica situado na Zona Oeste de São Paulo — isto é, não é um lugar centralizado como pode ser a Avenida Paulista e, pior ainda, localiza-se em uma região povoada e frequentada pela burguesia e pela pequena-burguesia, não pelos trabalhadores.
De fato, há uma tendência muito forte à mobilização dos trabalhadores contra a extrema-direita. Uma tendência que se verificou, por exemplo, no ato organizado pelas torcidas de futebol em São Paulo no dia 31 de maio. O ato do Largo da Batata, contudo, não aponta para o mesmo sentido. Apesar de ter contado com algumas centenas de manifestantes — o que é um fator positivo diante da situação da pandemia de coronavírus —, o fato é que a capitulação para a direita está em total contraste com o caráter combativo de várias manifestações que se viu no Brasil.
O cálculo de Boulos e da Frente Povo sem Medo, ao desmarcar o ato na Paulista, é o de que seria melhor evitar um confronto com a polícia — isto é, com a direita. O ato organizado no Largo da Batata, no final das contas, não contou com uma ação intimidatória da polícia. E isso não aconteceu simplesmente porque o ato no Largo da Batata não impacta a burguesia da mesma maneira que um ato na Avenida Paulista. Quando a esquerda não estava saindo às ruas, os bolsonaristas puderam se manifestar livremente na Paulista. A polícia não reprimiu ato algum.
Mas a questão que deve ser colocada diante disso é: o que a esquerda tem a ganhar se não enfrentar seus inimigos de classe? E mais: a tendência expressa no ato do da 31 de maio, organizado pelos torcedores, é a de enfrentar a direita ou de baixar a cabeça para a polícia e para João Doria? Ora, a resposta da segunda pergunta já encaminha a resposta para a primeira! O que tornou o ato do dia 31 de maio combativo e o que fez com que o País inteiro começasse a se organizar para enfrentar o fascismo foi o fato de que os torcedores partiram para cima dos bolsonaristas. O ato do dia 31 de maio não foi um ato para que um político que tenta se adaptar ao regime, como o próprio Boulos, subisse em um palco para discursar. Foi um ato em que os manifestantes queriam expulsar a direita da rua.
Como Boulos pretende erguer uma “muralha” contra o fascismo se está colocando a direita na rua? Concretamente, convocar o ato no Largo da Batata no dia 7 de junho correspondeu a colocar a polícia na Avenida Paulista. É o mesmo que entregar o local de manifestação dos trabalhadores nas mãos de João Doria. Nesses termos, o ato de Boulos não foi uma “muralha”, mas sim uma capitulação que abriu a porteira para que a direita ganhasse as ruas.
Evitar confronto, fazer acordos obscuros com governos de extrema-direita e baixar a cabeça para a polícia não constituem uma fórmula eficaz para combater o fascismo. É preciso, portanto, ser menos “criativo” e aplicar a política que foi levada pelos torcedores, e que foi levada por todos os movimentos que conseguiram derrotar o fascismo: é preciso mobilizar amplamente as massas para ocupar as ruas e forçar a extrema-direita a recuar, pelo meio que for preciso.