Aproxima-se o dia 18 de maio, que é conhecido como o dia da luta antimanicomial por trabalhadores e usuários dos serviços de saúde mental no Brasil todo, dia no qual tornou-se tradição dos serviços de saúde mental – principalmente dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) – sair às ruas para defender a Reforma Psiquiátrica Brasileira.
No Brasil, o movimento da reforma psiquiátrica (também conhecido como antimanicomial) surgiu nos anos 1970, composto por usuários e trabalhadores dos serviços de saúde mental, mas também com a colaboração de sindicatos, associações etc. O seu surgimento, portanto, se deu no contexto do ascenso das lutas contra a ditadura militar e da crise desse mesmo regime, mas também influenciado por movimentos que impulsionaram a reforma psiquiátrica em outros países, sendo que a principal influência vem do movimento de desinstitucionalização realizado na Itália.
Desde então, o movimento antimanicomial começou a denunciar os crimes cometidos contra pessoas em sofrimento psíquico nos hospitais psiquiátricos e outras instituições asilares, exigir o fim do manicômio e reivindicar direitos para o chamado “louco”. A principal palavra de ordem adotada por esse movimento foi “Por uma sociedade sem manicômios”.
Nessas décadas de luta, o movimento da Reforma Psiquiátrica obteve importantes vitórias, como o surgimento de serviços substitutivos que atendem pessoas em sofrimento psíquico relacionado a transtornos mentais e/ou uso problemático de álcool e outras drogas. Além disso, no campo das legislações, o movimento teve também vitórias como a aprovação da lei 10.216, também conhecida como Lei da Reforma Psiquiátrica. A aprovação da lei foi uma vitória parcial, pois após muitos anos tramitando no Congresso Nacional, ela foi aprovada com uma série de alterações.
Principalmente a partir do ano de 2013, a Reforma Psiquiátrica começou a sofrer uma série de ataques. Os ataques vieram de setores da sociedade que tem interesse em lucrar com a internação de pessoas em sofrimento psíquico, como donos de hospitais, a Associação Brasileira de Psiquiatria, igrejas que mantém as chamadas comunidades terapêuticas (instituições asilares privadas, em geral de caráter religioso, onde ocorrem inúmeras violações de direitos). Pressionado por esses movimentos, o governo Dilma (PT) cometeu o erro de ceder, concedendo a eles algumas vitórias, como abrir vias para o financiamento público das comunidades terapêuticas.
Com o golpe de Estado de 2016 (do qual participaram também os setores que vinham pressionando o governo pelo fim da Reforma Psiquiátrica) que derrubou o governo eleito por meio de um processo fraudulento de impeachment, Michel Temer e os demais golpistas realizaram ataques ainda mais duros à Reforma Psiquiátrica, com a chamada “Nova Política de Saúde Mental”, que nada têm de nova e que não passa de uma volta ao modelo de tratamento do manicômio. O golpe também levou à presidência o fascista Jair Bolsonaro, que vem realizando ataques ainda piores.
Por isso, é preciso explicar que os ataques à política de saúde mental e o retorno do modelo manicomial são consequências do regime golpista no qual vivemos e que caminha a passos largos para o estabelecimento de uma ditadura escancarada. Assim sendo, não há outra forma de barrar os ataques à reforma psiquiátrica que não seja a mobilização contra Bolsonaro e todos os golpistas, que precisam ser derrubados e substituídos por um governo dos trabalhadores e demais setores explorados e oprimidos da sociedade.
Há algum tempo que se observa, nesse campo de lutas (como em outros também), uma baixa intensidade da mobilização. Com a pandemia isso piorou, pois, assim como ocorreu em outros movimentos, a atividade praticamente se reduziu as chamadas “lives”, que, no máximo, podem ser considerados como formas de propaganda política, mas não são capazes de produzir o efeito de que necessitamos: barrar os ataques do governo contra os serviços de saúde mental e contra os direitos dos usuários desses serviços.
Entretanto, o argumento da pandemia não deve servir para impedir a realização de assembléias, atos (mobilizações reais), afinal, servidores da saúde no Brasil inteiro estão trabalhando presencialmente e os usuários, em sua maioria muito pobres, permanecem sendo obrigados a trabalhar, enfrentando diariamente aglomerações no transporte público. Muitos desses usuários estão em crise devido à situação caótica que se vive no país e, justamente por isso, não estão em isolamento e necessitam de cuidados. Por exemplo: muitos pacientes de serviços AD (álcool e drogas), como os CAPS AD, estão, neste momento, em recaída diante da situação de caos sanitário e social e diante da maior dificuldade de ter acesso ao atendimento nesse momento. Nesse sentido, a própria luta contra o governo responsável pelo verdadeiro inferno que o povo tem vivido é, por si só, algo que tende a contribuir para a reorganização mental desses pacientes e, até mesmo, dos trabalhadores da saúde mental, visto que muitos deles também estão em crise.
Por isso, é preciso retomar as assembleias, os atos, as mobilizações. Devem ser realizadas com os devidos cuidados sanitários, mas não se pode deixar a luta política de lado, visto que a ausência de mobilizações tende a resultar em um completo retrocesso da luta. O dia 18 de maio (dia da luta antimanicomial) deve ser a retomada das mobilizações. É preciso chamar trabalhadores e usuários dos serviços de saúde mental, bem como a sociedade como um todo, a sair às ruas em defesa da Reforma Psiquiátrica Brasileira, por uma sociedade sem manicômios e contra os ataques do governo ilegítimo de Bolsonaro.
Por uma sociedade sem manicômios, fora Bolsonaro e todos os golpistas!